Atravessamos um período difícil da nossa história.
Talvez um período em que a impotência perante tantas tragédias, atentados, catástrofes naturais se tornou o pão nosso de cada dia. Difícil de engolir.
Neste dia não foi diferente. Há pouco mais de um ano, os incêndios em redor de uma cidade que acabava de me acolher, deixaram-me na excitação de que alguma coisa estava fora do lugar e muito deveria ser feito.
Em redor de Braga eram quatro os incêndios!
Sempre tive uma espécie de pânico controlado ao mínimo sinal de fumo no horizonte ou ao cheiro a queimado. Talvez pela memória que guardo desde que em miúda, no regresso de Viseu com os meus pais, atravessei uma estrada ladeada por floresta que ardia.
Tenho flashes desse dia. E ainda que não haja qualquer registo, ficou na memória sem obedecer à vontade de partir. E a alimentar esta minha quase-paranóia com incêndios.
Neste dia acordámos cedo para rumar norte, onde mais uma história nos esperava.
Pelo caminho fui exclamando o encanto da paisagem e a vontade de voltar para fotografar os lugares ermos e incríveis que o nascer do sol foi oferecendo. Uma espécie de mistério revelado a cada raio de sol.
Depois de atravessar o Pinhal de Leiria, ainda verde e carregado de brumas e de muitos quilómetros na vontade de guardar para sempre o que ia vendo, encontrei Braga com vários incêndios em redor, sempre de coração apertado, sempre de olhar no horizonte a temer o pior, mas a prometer dar o meu melhor para que a cinza que ía aparecendo não tivesse qualquer impacto no desafio a que me propus.
Enraizei a esperança na história deles. A história deles. E a nossa. Fomos descobrindo a troca de olhares, o toque envergonhado e tivemos a certeza que só juntos faziam sentido.
Deixámos-nos encantar pelo lugar com uma vista incrível em redor, sem nunca perder de vista a coluna de fumo que se ía avolumando.
Com esta história conhecemos Braga de uma forma diferente. A vida na rua mesmo num domingo à noite, a simpatia das pessoas que tão bem nos receberam, a paisagem… e o coração apertado num sentido de pertença, de que, uma vez ali, aquele lugar já era também um bocadinho nosso. E um bocadinho de nosso ardia perante a nossa impotência.
Hoje, depois de tantas tragédias, impotência e horas de desespero desejamos que a única chama que ainda arda seja esta.
Que estas histórias de vida e amor se sobreponham à tragédia. Que plantem novas árvores, sim, mas que nunca se deixe de cultivar o amor pelo próximo. Hoje a história deles está aqui, uma luz aos meus olhos, cansados de ver imagens tristes.